Frase do Dia

Frase ao léu (tomara que ele leia): "Amor, só de mão."

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Linguagem do Tempo do Onça



Antigamente se falava de uma forma bem mais rica, por estranho que pareça, do que hoje em dia, em que os monossílabos levam a comer palavras importantes para o entendimento da comunicação.
Desde que percebi a diferença entre a linguagem atual e a de priscas eras, comecei a colecionar, anotando em meu canhenho termos considerados supimpas, que não perduram, juntamente com os de somenos, que também vão aos poucos desaparecendo.
Hoje em dia, por exemplo, quem está irritado não se abespinha nem chega às vias de fato. Mas não quer dizer que, à espera dos bucaneiros, centuriões não ensarilhem suas armas como nos tempos de antanho.
Os covardes não dão mais às de Vila Diogo. Não mais se transige ou se aquiesce. Nota-se que os cavalheiros de outrora seriam mais dúcteis, se assim podemos dizer.
Acabaram-se as tezes de alabastro, os lábios de carmim. As moças airosas não se casam mais, somente por dote, com mancebos sensaborões.
Nada é como dantes no quartel de Abrantes.
Não se olha de soslaio, nem mesmo para reparar na recôndita pucritude. Não mais se exaspera à exaustão diante da procrastinação, cada qual com suas idiossincrasias.
O choro é discreto, não se prorrompe mais em prantos, vertendo lágrimas de sangue. É raro um seio túrgido, peixes não mais pululam nos lagos, almocreves não carregam papéis em alforjes, picuás ou bocapios.
Bem banhados, não mais tresandamos a bodum.
Ninguém é salvo num átimo ou escapa por um triz. Não se enfrenta contenda por dá cá aquela palha, não se misturam água e azeite, é lé com lé, cré com cré.
Tocaias com bacamartes ou carabinas, solução para vendeta, não mais acontecem à luz do sol. E não se chega às escaramuças por dez réis de mel coado.
Não se bate na cangalha para o burro entender, acabaram os resignados pulhas e os párias definitivos.
Fim da socapa, adeus de mão fechada à sorrelfa. E não se escrevem mais algaravias.
Mas, como antes, poderosos não dão com os costados no xilindró. Só os pobres continuam obnubilados pelas medidas da corte. Bucéfalos ainda trafegam pelo Senado.
Se esqueceu a lhanesa nos idos de março e não se tugiu nem mugiu por isso.
Há mais rigor com a proteção à infância. Não se cometem, aos olhos dos pequerruchos, cenas estupefacientes, quando amiúde pais faziam troça, vista grossa e ouvidos de mercador a seus ais e só os inimigos do vilão tinham olhos de lince para ver e denunciar. Mas raramente os pegavam de afogadilho.
Não mais se conclui com destarte, nem se defende o bastião com brio.
Ainda se evacuam ambientes carregados, é certo, mas nunca se pegam os estroinas, os biltres e os achacadores ou os escarnecedores, que, antigamente, pegos com a boca na botija, eram obrigados a pedir intercessão de algum preceptor e lamentar-se, pranteando às catadupas.
Como diria o velho Bruxo do Cosme Velho, mudou o Natal ou mudamos nós?

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